Silêncio e Arquitetura
A Casa do Silêncio, de Juhani Pallasmaa e o arquiteto Kari Järvinen.
“O silêncio não é apenas uma experiência auditiva da ausência de som; é uma experiência multissensorial e existencial de ser, ao invés de ouvir. É esta “espessura” existencial e riqueza do silêncio que lhe confere autoridade poética.
O silêncio revela a essência das coisas, como se fosse percebido pelos sentidos humanos pela primeira vez. O silêncio é uma perceção atmosférica e qualitativa que funde a perceção e o observador.”
Em 1994 o arquiteto finlandês Juhani Pallasmaa participou deste projeto poético de criação de uma casa que respondesse criticamente ao nosso modo atual de convivência, hipervisual e ruidoso.
Em seus textos Pallasmaa defende uma arquitetura que acolhe o silêncio e oferece ao ser humano um lugar para habitar consigo mesmo. Ele entende o silêncio como uma qualidade existencial, capaz de intensificar a percepção do tempo e do espaço.
Livro Habitar Juhani Pallasmaa Gustavo Gili (GG Brasil)
Para Pallasma o silêncio tem uma qualidade sensorial que acolhe e convoca memórias. O tato é este sentido da proximidade e de intimidade que é convocado pelo silêncio.
O uso da madeira e da pedra, a integração com o entorno natural, a presença da luz natural são elementos utilizados nesta busca de uma ambiência que ressoe um pertencimento.
“A arquitetura que verdadeiramente habitamos é sempre silenciosa; ela nos envolve como uma pele, nos sustenta como um chão, nos protege como uma sombra. Esse silêncio é tátil, pois nasce do encontro da pele com a matéria.”
O arquiteto entende o tátil como um modo de pensar e de estar no mundo.
Uma casa que dá aos corpos e gestos uma dimensão mais humana e acolhedora, um território que convida a presença. Nós não habitamos apenas espaços geométricos, mas lugares carregados de significados. O lugar é sempre corpo, memória e identidade. Ele se constrói pela sobreposição de camadas sensoriais: sons, cheiros, temperaturas, aromas, lembranças .
“O espaço abstrato é rarefeito e indiferente. O lugar, ao contrário, é denso, espesso de significados, memórias e afetos. Habitar é apropriar-se de um lugar.” (Habitar, 2018)
O lugar é um para Pallasmaa um campo de silêncio em contraposição as arquiteturas dos “não lugares", conceito crítico de Marc Augé, que são espaços desprovidos de identidade sensorial e são apenas para passagem: shopping center, aeroportos. Seu trabalho é de criar o contrário desta neutralidade e indiferença:
“A arquitetura não nos dá apenas abrigo; ela também nos dá um lugar no mundo e nos estrutura em relação ao tempo, à cultura e à própria existência.”
A casa é assim um abrigo, um lugar de retiro e de fortalecimento interior, de escuta profunda das existências que nos cercam. Ele retoma aqui a defesa da casa de Gaston Bachelard, como o lugar onde aprendemos a “morar em nós mesmos".
Em seu livro A Poética do espaço, Bachelard aconselha :
“A casa, na vida do homem, afasta contingências, multiplica seus conselhos de continuidade. Sem ela, o homem seria um ser disperso. Ela mantém o homem através das tempestades do céu e das tempestades da vida. Ela é corpo e alma. É o primeiro mundo do ser humano”.
Este texto faz parte da pesquisa da nova residência criativa sobre o Silêncio nos processos de criação. Saiba mais no site: https://www.residenciacriativa.com/2025