Helena Almeida : ouve o que meu corpo te diz
"o desejo de que a pintura e o desenho se tornem corpo, de que se anule a distância entre corpo e obra"
Helena Almeida é uma artista portuguesa que utilizou a fotografia como recurso para transver a tela, embora não tenha abandonado a pintura, transformou o sentido deste suporte.
Seus trabalhos são realizados de maneira híbrida no sentido material, uma vez que não se reduz à impressão da fotografia e sim numa busca intencional por uma narrativa através das intervenções plásticas na imagem.
Um exemplo é o uso da tinta azul em suas séries, com cortes cinematográficos onde as obras ganham característica de performance, deslocando a questão técnica para uma questão expressiva de vivências.
A artista raramente usava palavras ou sons explícitos. Em vez disso, usava o corpo como linguagem, criando composições em que ela própria aparece, muitas vezes em preto e branco, interagindo com o espaço, com objetos e com a tela — como na série :
"A minha obra é o meu corpo, o meu corpo é a minha obra".
Em entrevista a artista declara:
“A fotografia não é importante. O importante é o processo”
A curadora Isabel Carlos, em seu ensaio no catálogo da exposição Fotografia habitada, destaca como Helena Almeida concebia cada obra como resultado de um processo meticuloso, onde o silêncio desempenha um papel fundamental:
“Na produção de Helena Almeida, o registro fotográfico passa a ser a ponta final de um processo – aqui no sentido de trabalho – que pode demorar dias ou meses no ateliê. Cada imagem, gesto, posição, enquadramento, o lugar de onde será tirada a fotografia, é primeiro pensado-desenhado como um cineasta pensa e eventualmente desenha cada plano de um filme, ou um desenhador concebe uma vinheta de banda desenhada.”
Em fins da década de 1970, as imagens de Helena Almeida possuem tom mais dramático, sobretudo nas séries “Ouve-me”, “ Sente-me” e “Vê -me” de 1979.
Nestas obras de Helena Almeida, especialmente nas suas fotografias performativas, percebemos que o silêncio está presente como uma camada conceitual.
Em uma sociedade (e num meio artístico) ainda marcado pela invisibilidade das mulheres, Helena transforma o silêncio em uma forma de existir com força.
O outro nos chama — e esta chamada é muitas vezes silenciosa.
O rosto do outro nos interpela mesmo que seja apenas com um olhar.
O nosso corpo diz mais alto e mais forte que as nossas palavras.
Estudos na área da Comunicação indicam que a linguagem corporal, influencia mais a percepção do que as palavras. A comunicação não verbal engloba gestos, posturas, expressões faciais e outros sinais que transmitem informações e emoções.
Helena era uma pesquisadora profunda destes gestos e expressões, ela retornava sempre a estas investigações aprofundando em sua linguagem artística o seu entendimento de nuances e novas possibilidades. Como ela mesma declara :
Qual é a emoção que sentimos quando não conseguimos dizer o que sentimos ?
Qual é a emoção quando mesmo dizendo não somos escutadas ?
As histórias de Helena falam pra além de suas experiências, elas refletem emoções comuns que calam nas palavras mas que se expressam de forma explícita no corpo.
Você é capaz de ouvir este não dito e acolhê-lo ?
Recomendo esta visita comentada a exposição das obras de Helena Almeida por Rosana Paulino, uma delicadeza e lucidez incrível.